153. 13 sugestões para hortas escolares

A boa notícia é que as escolas querem hortas. Só que não é tão fácil assim fazer um projeto relevante. Para tentar ajudar, escrevi esse post. Ainda me considero uma agricultora pouco experiente, mas já dá para compartilhar o que tenho aprendido nos últimos anos sobre cultivo de alimentos e ativismo coletivo.

Bom, esse é um post aberto. Por favor dê sugestões e escreva suas dúvidas que aos poucos vamos completando e aperfeiçoando o roteiro da horta escolar, está bom?

1. Responder 2 perguntas –  Por que fazer uma horta na escola? Como a horta vai se relacionar com as atividades pedagógicas e comunitárias da escola? É legal responder por escrito e coletivamente (todos que participarão do projeto). Reler e atualizar de vez em quando.

2. Começar fazendo – Cuidar de uma horta é que nem cozinhar, andar de bicicleta, ter um cachorro, educar um filho. Estudar e planejar antes ajuda, mas a prática costuma ser bem diferente do que foi imaginado. Então coloque logo a mão na terra e comece pequeno. Alguns vasos ou um metro quadrado de chão já é o suficiente para iniciar. Sem nunca ter plantado nada, a gente não sabe nem fazer as perguntas.

3. Iniciar o aprendizado pelos adultos –Já faz algumas décadas que o hábito de cultivar alimentos no quintal foi abandonado por quase todos. Então temos gerações de adultos que nunca plantaram nada. Alguns até sentem medo e nojo da terra e das minhocas. É importante reconhecer, aceitar e refletir sobre esses sentimentos. E, quem sabe, esperar um pouco para iniciar as atividades com os estudantes. Vale a pena os educadores envolvidos com o projeto investirem tempo e energia em adquirir um pouco de experiência antes de envolver os alunos na atividade. No caso de se perceberem pouco à vontade com a ideia da horta, repensar o projeto e a participação.

4. Definir (e respeitar) os guardiões da horta – Quem vai cuidar da horta no dia-a-dia? Quem vai se preocupar com a falta e o excesso de chuvas, o vento, o granizo e as temperaturas extremas? Quem vai se virar para arranjar os insumos e sair correndo para acudir a horta em caso de necessidade? O diretor da escola? Um ou vários educadores? Outro funcionário? Pais de alunos? Voluntários? A pessoa ou as pessoas que assumirem esse papel merecem reconhecimento e liberdade para trabalhar. Só quem está ali no dia-a-dia com a enxada na mão é que sabe do que a horta precisa e quais são suas potencialidades. Talvez seja alguém não muito graduado na hierarquia da instituição e com pouca escolaridade, mas que traz consigo o principal: amor à terra. Os guardiões da horta devem decidir (debatendo com a direção da escola) o que é o melhor para ela e os rumos a serem tomados. E também as estratégias para manter a horta durante as férias, feriados e finais de semana.

5. Deixar as crianças brincarem – A simples existência da horta na escola já traz muitas oportunidades de reconexão com a natureza. Se as atividades por lá forem excessivamente dirigidas e pouco lúdicas, talvez tenham o efeito inverso do esperado, ou seja, os alunos detestarem a horta. Caso a horta vire um espaço sobretudo para fazer fotos e dar um verniz ecológico para escola, também não é legal. Bom mesmo é deixar o acesso livre para os estudantes poderem brincar e colher livremente. E se a horta virar uma sala de aula ao ar livre, com atividades de matemática, arte, ciências, história, geografia, melhor ainda! A intervenção dos adultos pode ser mínima em alguns momentos, apenas para evitar depredações e desperdício (principalmente nos primeiros tempos, depois não será mais necessário).  Ah, cuidado com o excesso de rega. Regar é uma atividade simples e divertida, mas água em excesso mata muita planta.

Quando a horta vai precisar mesmo ser usada para complementar a merenda e ajudar a garantir a segurança alimentar dos estudantes, sugiro fazer parcerias com agricultores profissionais para viabilizar o cultivo intensivo, sendo que eles podem trocar uma parte da produção pela possibilidade de acessar a terra e os insumos oferecidos pela escola.

6. Quebrar o concreto – A maior parte das escolas (assim como das residências, empresas, hospitais, igrejas, condomínios e ruas) tem cimento demais. Que tal tirar o pavimento da escola onde for possível e trazer de volta o solo, as plantas, os bichinhos? Isso deixará o ambiente mais fresco, menos poluído, menos barulhento. E os estudantes mais calmos, já que o verde reduz o estresse e a correria.

7. Plantar flores, PANCs e receber bem os bichinhos – Se vocês criarem um lindo jardim comestível provavelmente esse vai ser o canto mais agradável e mais amado da escola. Veja bem: a horta não precisa ser apenas um local com canteiros retangulares e hortaliças convencionais. É melhor que não seja, aliás. Plante pensando nos serviços ambientais que ela vai oferecer, como, por exemplo, abrigo de microfauna (incluindo as valiosas abelhas nativas sem ferrão) e reserva de biodiversidade vegetal sobretudo comestível. Por isso vale a pena aprender a identificar, cultivar e deixar nascer sozinhas muitas Plantas Alimentícias Não Convencionais (as PANCs).

8. Observar o que a terra quer produzir – Agricultores iniciantes em geral só querem cultivar alface, tomate, cenoura e outras espécies comuns de supermercado. Mas com o tempo a gente percebe que mais importante ainda é trazer de volta para nossos canteiros e nossas refeições as plantas que já fizeram parte das nossas tradições culinárias, mas hoje são tão raras que ficaram conhecidas como PANCs  (Plantas Alimentícias Não Convencionais ). E tem também alimentos tradicionais que facilitam a vida, pois não exigem muita dedicação: batata doce e mandioca, por exemplo.  Várias PANCs são muito nutritivas e bem fáceis de cultivar. E ao plantar tudo misturado vocês vão perceber quais espécies combinam e que isso ajuda a evitar infestações de bichinhos que alguns consideram pragas (eu não acredito em pragas, só acredito em proliferações que acontecem quando o ambiente não está equilibrado). A melhor maneira de aprender agricultura é assim: plantando e observando. Algumas PANCs: caruru, ora-pro-nobis, almeirão selvagem, bertalha, serralha, capuchinha, taioba, nirá, peixinho.

9. Não desperdiçar matéria orgânica – Fazendo compostagem, não é preciso comprar terra nem adubo, basta enriquecer o solo com matéria orgânica. Toda folha seca e graveto que cai no terreno da escola deve ser devolvido ao solo. E quase todos os resíduos da cozinha podem ser compostados. Aqui tem um guia muito legal sobre o tema, elaborado pela jornalista Raquel Ribeiro: http://www.compostagem.ecophysis.com.br/files/Guia-de-Compostagem-Caseira—Raquel-Ribeiro—2-Edicao—2013.pdf .

10. Ser criterioso com o reaproveitamento de materiais – Fazer uma horta na escola não demanda muito material. Regadores podem ser construídos a partir de embalagens plásticas e bordas de canteiros com sobras de madeira ou telhas. Na minha opinião, no entanto, com exceção dos regadores, convém evitar o plástico. As matérias primas naturais (madeira e pedras) deixam o visual mais bonito e evitam as falsas mensagens ecológicas. Virou mania as escolas pedirem para os alunos levarem embalagens plásticas para reaproveitar (inclusive de bebidas nada saudáveis) e sou contra essa prática, pois estimula o consumo e passa uma impressão – falsa – de que esse reaproveitamento resolve os problemas causados pelo plástico no mundo. Minha experiência com vasos em garrafa pet também foi ruim: são muito pequenos, esquentam demais, não respiram, podem liberar Bisfenol A. Não uso mais de jeito nenhum. Com pneus a situação é ainda mais complicada, pois eles contaminam o solo, de acordo a pesquisa “Reciclagem de granulados de pneus inservíveis em pavimentos de playgrounds: estudos de caso de avaliação de riscos à saúde humana e ao meio ambiente”, da arquiteta Mara Cabral  (infelizmente ainda não publicada). Mas esse post do blog “Hortas orgânicas e alimentação saudável’ traz diversos links internacionais sobre o tema http://sustentaveleorganico.blogspot.com.br/2015/05/bom-dia-pessoal.html.

11. Trocar sementes e mudas – A natureza é abundante e, a partir do momento em que começamos a plantar, passamos a produzir mudas e sementes em nossas hortas. Os agricultores sempre as trocaram entre si e esses momentos são muito intensos em dicas e aprendizados. Existem grupos realizando encontros em torno de mudas em sementes em diversas regiões. Para entrar nesse mundo sugiro participar da comunidade Semear Conhecimentos (https://www.facebook.com/Semearconhecimentos/).

12. Abrir as portas para a comunidade – A horta é um excelente mediador social. Todos têm memórias, experiências e vivências relacionadas à comida que vêm à tona quando estamos lidando com os canteiros. Fazer eventos e convidar pais de alunos e vizinhos para participar das atividades da horta pode dar muito certo. Só cuidado com o excesso de expectativa em relação aos voluntários. Cuidar de horta é maravilhoso, mas dá trabalho e inclui muito serviço pesado. Depender de voluntários para a manutenção nem sempre dá certo. Sobretudo se os voluntários forem vistos apenas como mão de obra e as decisões ficarem por conta de quem não costuma pegar na enxada.

13. Receber lições dos agricultores – Precisa de ajuda? Ninguém melhor para orientar do que o agricultor profissional, aquele que tira seu sustento da terra todos os dias. Convide-os e convide-as (mulheres são maioria na agricultura urbana) para visitar a horta, mas fique atento a alguns detalhes que, se não forem bem cuidados, podem causar desconforto. Para começar, numa escola não pode entrar agrotóxico. Então certifique-se de que o agricultor ou agricultora usa técnicas orgânicas. Lembre também que os agricultores são mal pagos e pouco valorizados em nossa sociedade. Por esse motivo, ele ou ela provavelmente não poderá se dedicar à horta da escola sem receber remuneração. Mas uma aula especial ou uma homenagem serão muito bem-vindas e a horta escolar se beneficiará de dicas preciosas.

PARA SABER MAIS
Livros e manuais incríveis (em português)
A Fuga das Minhocas, de Raquel Ribeiro – Uma história deliciosa que apresenta o assunto compostagem e hortas para as crianças.

Horta Escolar / Uma sala de aula ao ar livre, de Amanda Frugg, Bruno Helvécio, Lucas Ciola e Peter Webb – Bem completo, com orientações, depoimentos e sugestões de atividades para fazer com os estudantes.

Manual para Gestão de Resíduos Orgânicos nas Escolas, lançado pelo ISWA (Internacional Solid Waste Association) em parceria com a ABRELPE (Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública). Link para download aqui:  http://www.abrelpe.org.br/noticias_detalhe.cfm?NoticiasID=2555

Livros/sites incríveis (em inglês)
American Grown, Michelle Obama – Um relato lindamente ilustrado sobre a horta da Casa Branca durante a gestão Obama. A horta, aliás, foi criada como um projeto de combate à obesidade infantil entre os alunos das escolas públicas de Washington.

Edible Schoolyard/A Universal Idea, de Alice Waters – Uma escola pública de má fama em Berkeley, California, floresceu quando a famosa chef aceitou o desafio de mexer na cozinha de lá e quebrar o concreto de uma quadra esportiva pouco usada para criar uma horta. Agora o projeto está em diversos lugares do mundo: http://edibleschoolyard.org/

Incredible! Plant Veg, Grow a Revolution, de Pam Wharhurst e Joanna Dobson – Um relato bem aprofundando da experiência de Todmorden, a cidadezinha inglesa que renasceu (inclusive economicamente) quando as hortas invadiram todos os espaços públicos, inclusive as escolas. No site tem muita informação também: https://www.incredible-edible-todmorden.co.uk/.

PARA TERMINAR
Algumas frases sobre hortas e escolas que já ouvi e não gostei muito…

“Estou ligando para você porque minha diretora quer uma horta”

“Queremos fazer uma horta vertical de garrafa PET”

“Você pode chamar os hortelões urbanos para cuidar da horta na nossa escola?”

“Queremos levar um grupo grande de crianças para trabalhar na sua horta apenas por um dia”

“Vamos fazer uma horta na escola. Arranja para a gente a terra, as mudas e as sementes?”

“Crianças: cuidado! Não mexe aí! Não corre! Fica quieto e escuta! Não põe a mão na terra! Não vá se sujar”

PARA TERMINAR MESMO
Traduzi algumas páginas (129 a 131) do livro Incredible! que dão uma ideia de como mobilizar a escola por meio da horta. Sim, as condições ali são bem melhores do que na maioria das escolas brasileiras. Mesmo assim, vale pela inspiração.

 Como diretora da escola, você pode ter as melhores ideias, mas a menos que exista alguém na equipe fazendo o projeto acontecer, não deslancha”, disse Helen Plaice [diretora da escola de Ensino Médio de Todmorden – Tod High]. “Você gira em falso e não alcança os estudantes”. Então foi feita uma chamada para que alguém aceitasse o posto de Líder de Estudos Vocacionais e o candidato bem sucedido foi o professor de Física, Paul Murray. Deram a ele alguns períodos livres durante a semana para trabalhar no currículo e algum dinheiro extra para remunerar suas novas responsabilidades. Para Helen isso era crucial para alcançar mudanças duradouras.  A nova posição deu a Paul a autoridade para fazer perguntas e pedidos a outros membros da equipe, o que seria impossível para alguém que estivesse trabalhando voluntariamente.

O ponto de mudança para a escola inteira aconteceu no verão quando Paul organizou o “Dia Diferente”, o nome que a escola dá para o dia em que o currículo normal é suspenso e os professores se voluntariam para realizar atividades com os alunos de uma série em particular. Um exemplo típico seria oficinas para desenvolver habilidades de estudo para alunos que se aproximam dos exames nacionais. Mas em vez disso Paul planejava algo muito mais imaginativo e nessa ocasião ele pegou os alunos mais jovens, de 12 e 13 anos, e deu-lhes um dia que não só eles como também os professores iriam lembrar como o dia em que viram as conexões entre comida e aprendizagem sob uma perspectiva completamente diferente.

Primeiro, Paul convidou Sally e Jonathan, os fazendeiros que já estavam fornecendo para Tod High a maior parte de sua carne, a trazer alguns de seus animais para a escola e montaram  uma minifazenda no gramado. Lá estavam os porquinhos e bezerros para providenciar o fator “ahhh” e, apesar de haver muita agricultura na área, foi a primeira vez que alguns alunos tocaram em um animal de fazenda. Então Paul apresentou uma série de atividades para ajudar as crianças e adolescentes a pensar sobre comida de novas maneiras. Aconteceram aulas sobre o ciclo de vida das plantas e como construir um minhocário, havia estudantes calculando os quilômetros rodados por cada tipo de maçã para chegar à sua mesa e suposições sobre qual a porcentagem do preço se devia ao transporte. Então eles estudaram as proporções para produzir smoothies [um tipo de suco mais consistente]: quantos kiwis são necessários para uma determinada quantidade de abacaxis, por exemplo.

Tony [chef local] apareceu com algumas demonstrações culinárias e fez com que os estudantes montassem saladas usando os ingredientes que eles tinham cultivado na escola. No fim do dia os professores estavam  vibrando com ideias para incluir temas sobre alimentação em suas áreas de ensino, exatamente o que Helen esperava que acontecesse quando designou Paul . “A equipe saiu da escola naquele dia vendo o currículo de uma perspectiva diferente”, ela disse. “Acho que se eu tivesse dito simplesmente que era para inserir três atividades relacionadas a comida no planejamento pedagógico até o fim do ano eles teriam pensado ‘o que será que ela bebeu?’”.

Gradualmente o assunto comida começou a entrar em todas as partes do currículo. A escola tem status de especialista em artes visuais e os professores de arte foram os primeiros a aderir, produzindo, entre outras coisas , um livro com as melhores receitas de Tony, lindamente ilustrado pelos alunos. Um estudante que se preparava para a universidade trabalhou com o Incredible Edible para produzir posters que ele poderia apresentar como parte de seu portfólio de design gráfico. Em história, os estudantes aprenderam sobre comida em diferentes épocas e em ciências estudaram a composição dos diferentes alimentos. Em matemática calcularam qual porcentagem de um salário mínimo é gasta com alimentação e então trabalharam com o departamento de Tecnologia Alimentar para comparar o custo e o valor nutricional da comida processada e da comida feita em casa (a comida fresca se mostrou 40% mais barata). Em todas as áreas, o objetivo era enviar mensagens sobre nutrição, higiene, sustentabilidade e ética da produção de alimentos. Para Paul, uma das mais importantes recompensas provenientes dessa abordagem foi que os estudantes não estavam apenas aumentando seus conhecimentos sobre determinados assuntos como também adquirindo habilidades vitais como administração financeira e como fazer escolhas que beneficiem a própria saúde.

152. Governantes: plantar e cuidar das árvores urbanas deve ser prioridade

Por Tiana Moreira, Claudia Visoni e Thais Mauad*

É uma questão de saúde pública e de fazer uma melhor gestão dos recursos financeiros, como os diversos estudos relacionados abaixo comprovam. Os governantes devem priorizar não só o plantio e manutenção das áreas verdes nas cidades como também a disseminação desses conhecimentos para combater os atos de vandalismo e maus tratos que a população tem infringido às árvores. O gestor público que tomar essas providências com certeza será reconhecido por sua contribuição à saúde e ao bem-estar da população, além de economizar muito dinheiro público.


Poluição atmosférica mata
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), mais de 80 % da população mundial esta exposta à poluição do ar (1), sendo que na maioria dos grandes centros urbanos brasileiros a presença de poluentes no ar ultrapassa os limites estabelecidos pela própria OMS (2). Sem contabilizar as perdas afetivas, que são inestimáveis, o Banco Mundial calcula em US$4,9 bilhões/ano o custo das mortes relacionadas a poluentes do ar no Brasil (3).

Em São Paulo, as mortes prematuras relacionadas à poluição atmosférica alcançam 4 mil pessoas/ano (3). E centenas de milhares de pessoas — sobretudo idosos, bebês e gestantes — sofrem de agravamento das condições respiratórias devido à poluição. Vale lembrar que 73% da poluição atmosférica de São Paulo é proveniente de veículos automotores (4).

As árvores são nosso único filtro para a poluição do ar
Um estudo americano demonstrou que as árvores urbanas americanas removeram 17,4 milhões de toneladas de poluentes/ano gerando uma economia de 6,8 bilhões de dólares/ano no setor de saúde (5). Já outra pesquisa inglesa demonstrou que apenas uma árvore na calçada em frente a um imóvel é capaz de remover cerca de 50% do material particulado (poeira) em seu interior (6).

Árvores melhoram a saúde mental, evitam partos precoces e aumentam a longevidade
Estudo realizado em quatro cidades europeias demonstra que quanto maior o tempo visitando áreas verdes, melhor a autoavaliação do estado de saúde dos pacientes psiquiátricos, independentemente dos contextos culturais e climáticos (7). Pesquisa realizada na Pensilvânia (EUA) indica que morar a até 1250 m, ou seja, 10 a 15 minutos de caminhada de áreas verdes é um fator significativo para reduzir os partos precoces e o baixo peso ao nascer (8). Em Tóquio, um estudo identificou que idosos que moravam próximos a áreas verdes tiveram um aumento da longevidade (9).

Árvores ajudam a combater enchentes, criminalidade, manter construções e valorizam imóveis
As áreas verdes urbanas reduzem o escoamento superficial da água diminuindo assim os riscos de enchentes (10).

A arborização tem efeito até mesmo na área da segurança urbana. Estudo feito na cidade de Baltimore (EUA) relacionou um aumento de 10 % nas copas das árvores a uma redução de 12 % na criminalidade (11).

A sombra das árvores alivia o calor na superfície do asfalto e edificações, ampliando a vida útil dos pavimentos e outros materiais construtivos, reduzindo em até 58 % os custos de recuperação e manutenção do asfalto (12). A vegetação também diminui a temperatura dos ambientes internos, reduzindo a necessidade do uso de ar condicionado, o que leva a economia de eletricidade (13). Barreiras verdes reduzem ainda os níveis de ruído (14). Em climas tropicais como o nosso, as árvores ajudam a aumentar o conforto urbano e reduzir as ilhas de calor.

Propriedades localizadas em ruas e bairros verdes são mais valorizadas de acordo com uma pesquisa feita em Portland (EUA). As casas à venda em ruas arborizadas foram comercializadas por 7130 dólares a mais em média que as casas em ruas não arborizadas, além de o negócio ter sido realizado duas vezes mais rápido (15).

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* Tiana Moreira é engenheira agrônoma, paisagista, mestre, doutora e pós-doutoranda na Faculdade de Medicina da USP.
Claudia Visoni é jornalista, ambientalista, agricultora urbana e conselheira do CADES Pinheiros.
Thais Mauad é Professora Associada da Faculdade de Medicina da USP, doutora em patologia, ambientalista e conselheira do CADES Pinheiros. Coordenadora do Grupo de Estudos em Agricultura Urbana do Instituto de Estudos Avançados da USP.

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ESTUDOS CITADOS NESSE TEXTO

(1)OMS, 2016, Ambientairpollution: A global assessmentofexposureandburdenofdisease. (http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/250141/1/9789241511353-eng.pdf?ua=1)

(2)DE MIRANDA, Regina Maura et al. Urban air pollution: a representative survey of PM2. 5 mass concentrations in six Brazilian cities. Air quality, atmosphere&health, v. 5, n. 1, p. 63-77, 2012.

(3) Banco Mundial, 2016 – “World Bank; Institute for Health Metrics and Evaluation. 2016. The Cost of Air Pollution : Strengthening the Economic Case for Action. World Bank, Washington, DC. © World Bank. https://openknowledge.worldbank.org/handle/10986/25013.

(4)MOREIRA, Tiana Carla Lopes et al. Intra-urban biomonitoring: Source apportionment using tree barks to identify air pollution sources. Environment international, v. 91, p. 271-275, 2016.

(5)  NOWAK, David J. et al. Tree and forest effects on air quality and human health in the United States. Environmental Pollution, v. 193, p. 119-129, 2014.(5) Maheret al., 2013

(6) MAHER, Barbara A. et al. Impact of roadside tree lines on indoor concentrations of traffic-derived particulate matter. Environmental science & technology, v. 47, n. 23, p. 13737-13744, 2013.

(7) VAN DEN BERG, Magdalena et al. Visiting green space is associated with mental health and vitality: A cross-sectional study in four europeancities.Health& place, v. 38, p. 8-15, 2016.

(8) CASEY, Joan A. et al. Greenness and Birth Outcomes in a Range of Pennsylvania Communities. International journal of environmental research and public health, v. 13, n. 3, p. 311, 2016.

(9) TAKANO, Takehito; NAKAMURA, Keiko; WATANABE, Masafumi. Urban residential environments and senior citizens’ longevity in megacity areas: the importance of walkable green spaces. Journal of epidemiology and community health, v. 56, n. 12, p. 913-918, 2002.

(10) XIAO, Qingfu et al. Rainfall interception by Sacramento’s urban forest. Journal of Arboriculture, v. 24, p. 235-244, 1998.

(11) TROY, Austin; GROVE, J. Morgan; O’NEIL-DUNNE, Jarlath. The relationship between tree canopy and crime rates across an urban–rural gradient in the greater Baltimore region. Landscape and Urban Planning, v. 106, n. 3, p. 262-270, 2012.

(12)MCPHERSON, E. Gregory; MUCHNICK, Jules. Effects of street tree shade on asphalt concrete pavement performance. 2005.

(13) MCPHERSON, E. Gregory; SIMPSON, James R. Potential energy savings in buildings by an urban tree planting programme in California. Urban Forestry & Urban Greening, v. 2, n. 2, p. 73-86, 2003.

(14) NOWAK, David J.; DWYER, John F. Understanding the benefits and costs of urban forest ecosystems. In: Urban and community forestry in the northeast. Springer Netherlands, 2007. p. 25-46.

(15)DONOVAN, Geoffrey H.; BUTRY, David T. Trees in the city: Valuing street trees in Portland, Oregon. Landscape and Urban Planning, v. 94, n. 2, p. 77-83, 2010.

151. Microcurso de horta

O que dá para aprender sobre horta em um texto? Bastante coisa. Quanto tempo leva para aprender tudo sobre horta? Muito mais do que uma vida inteira. E no meio desse paradoxo do tempo os agricultores há milênios vêm repetindo o ciclo mágico de semear, cuidar, colher, compostar. Aqui vão 10 lições sobre hortas domésticas e hortas comunitárias que podem ser úteis.   

MICROLIÇÃO 1 – SONHAR
A primeira etapa para fazer uma horta é a “fase do sonho”. Vale a pena dar tempo ao tempo. Deixe a sementinha da vontade de ter uma horta, seja em casa ou na praça, criar raízes dentro de você. Passeie pelo bairro, pela varanda ou pelo jardim observando o espaço disponível, a incidência de sol (o ideal é pelo menos 5 horas por dia) e de vento (quanto menos melhor). Converse com os amigos e possíveis parceiros, pesquise sobre o assunto, visite quem já possui uma horta e as hortas comunitárias. Comece logo a fazer compostagem: assim você já vai preparando o adubo enquanto planeja sua lavoura.

MICROLIÇÃO 2 – ONDE PLANTAR?
HORTA DOMÉSTICA – Em qualquer canto que bata sol direto pelo menos 4 horas por dia e, de preferência, não vente muito. Para começar, quanto menor a horta, melhor. Um metro quadrado ou quatro vasos está muito bom. Quando pegar o jeito, você vai expandindo aos poucos a roça. Grandes áreas são trabalhosas e quem está começando precisa aprender a encaixar as atividades de agricultor na rotina diária. Se não tiver acesso ao solo, faça canteiros elevados ou plante em vasos. Um bom tamanho para os vasos é a partir de 30 cm de diâmetro. Os menorzinhos são úteis só para fazer mudas ou cultivar espécies menores, como cebolinha, salsinha e tomilho. Vasos de barro são os melhores.

HORTA COMUNITÁRIA – Pode ser no jardim do condomínio, na escola, na empresa, na igreja ou na praça. Em São Paulo não há uma lei proibindo as hortas em praça, mas ainda não existe regulamentação para a atividade. Procure locais ensolarados, sem vento e longe de pontos muito carregados de tráfego (por causa da poluição).  Certifique-se de que o solo não está contaminado (tema da próxima Microlição). Vá conversando com os vizinhos porque é fundamental a comunidade apoiar a horta. E procure o Conselho de Meio Ambiente (CADES) da subprefeitura. Fazer amizade com os trabalhadores da prefeitura que fazem a manutenção das áreas verdes do bairro também ajuda muito.

MICROLIÇÃO 3 – NA CIDADE NÃO É TUDO CONTAMINADO?
Não, nem tudo. E o campo também tem bastante contaminação hoje em dia. O assunto é complexo e vou tentar explicar um pouco resumidamente. No dia do Festival podemos aprofundar o debate. E quem tiver conhecimento na área, por favor compartilhe. Seja horta em casa ou no espaço público, os cuidados são semelhantes:

POLUIÇÃO ATMOSFÉRICA – Evitar regiões industriais e locais próximos a grandes avenidas e aeroportos. Se não for possível encontrar um lugar com boa qualidade do ar, colocar sempre barreira verde (árvores ou arbustos altos) entre a fonte de poluição de suas plantas. Prefira consumir as folhas e frutos jovens, que ficaram menos expostos. Mas não adianta ficar muito neurótico com isso porque suas plantas estão absorvendo o mesmo ar que você. O problema não é a horta: é o excesso de veículos e as outras fontes de poluição. Melhor comer seus vegetais cultivados na cidade do que não comer vegetais. E não há garantia de que os alimentos vendidos em supermercados e feiras estejam livres da poluição atmosférica (há muito cultivo ao lado de rodovias lotadas de caminhões, por exemplo).

CONTAMINAÇÃO DO SOLO – Pesquise no site da Cetesb se o local está na lista das áreas contaminadas (http://areascontaminadas.cetesb.sp.gov.br/relacao-de-areas-contaminadas/). Verifique se não há postos de gasolina num raio de 500m. Saiba se no terreno já houve indústria, posto de gasolina, depósito de lixo, oficina mecânica. Verifique se há infiltração de esgoto no terreno. Se deu positivo em algum dos itens anteriores, provavelmente o solo está contaminado. Se nada disso faz parte da história do terreno, provavelmente está OK para plantar (certeza só fazendo análise em laboratório). Se houver dúvida, não plante com a terra do local. Faça canteiro elevado e bem isolado (com alvernaria) do solo. Ou plante em vasos.

CONTAMINAÇÃO DA ÁGUA – Só regue com água cuja procedência você conhece e confia. Se for água do abastecimento (Sabesp) está OK. Se for água coletada da chuva, que a cisterna tenha filtro e seja feita com todas as precauções necessárias, inclusive contra criadouro de Aedes (dicas aqui: www.cisternaja.com). Se no local tem nascente ou poço, cheque todos os itens da contaminação do solo. Se falhar em algum aspecto, não use a água de jeito nenhum. Se estiver tudo OK, faça análise química e de coliformes antes de começar a usar na rega.

MICROLIÇÃO 4 – COMO PREPARAR O PLANTIO
SOLO – Planeje o desenho do seu canteiro, que pode ser retangular, em formato de fechadura, em espiral ou ter formas irregulares. Se for plantar no chão, delimite o local e vá cavando e quebrando a terra para retirar raízes, grama, pedrinhas. O ideal é aprofundar o buraco uns 40 centímetros. Depois de cavar, se possível peneire a terra retirada. Isole o canteiro do restante do terreno para evitar a volta da grama (tábuas velhas são ótimas para isso). Misture à terra peneirada composto orgânico, esterco e/ou húmus de minhoca (olha só a importância do minhocário doméstico!). Pó de osso também é muito bom (fonte de fósforo), assim como cinzas (potássio). Faça o monte de terra chegar a uns 20 cm de altura. Depois de montado o canteiro, nunca mais pise na terra. Por isso a largura máxima deve ser 1,20m. Se for possível acessá-lo apenas por um dos lados, reduza para uma medida que você alcance confortavelmente sem pisar. Cubra o canteiro com uma camada de mais de 10 cm de espessura de material seco (palha, folhas ou podas de grama). Para colocar as mudas, basta abrir a terra com as mãos. Essa orientação serve para áreas pequenas e para solos degradados. Se você tem um sítio inteiro para plantar, não é possível revolver e substituir a terra. Aí o caminho é a recuperação de solos degradados, o que é uma outra história e leva alguns anos. E se você vai plantar num local onde a terra já está superfértil, soltinha, cheia de nutrientes e de vida, sua vida está fácil (mas em geral isso não acontece).

COMO MONTAR O VASO
Camada 1 – Coloque no fundo 2 cm de argila expandida, cacos de telha ou pedaços de louça quebrada (com a parte convexa para cima). Em vasos grandes essa camada pode chegar a 10 cm. Preste atenção para não vedar totalmente os furos, pois um bom escoamento de água é fundamental. Ah, todo recipiente usado para o plantio precisa ter furos no fundo, se não a água fica parada e as raízes apodrecem. Para economizar espaço, eu dispenso essa camada nos vasos pequenos e vou direto para a próxima: o tecido.
Camada 2 – Em cima dos cacos, tecido de algodão (trapos). Evite a manta drenante vendida em lojas de jardinagem, que é feita de plástico reciclado e com o tempo entope. Já o algodão é muito melhor para essa função porque se decompõe e vira alimento para a planta. Uso minhas roupas até quase rasgarem e aí elas viram tecido de forração de vasos.
Camada 3 – Complete o vaso com terra adubada, deixando uma faixa superior livre, onde vai a cobertura de solo. Nos vasos maiores coloque uma camada de cerca de 5 cm de palha, serragem ou folhas bem secas. Nos vasos pequenos uns 2 cm bastam.

MICROLIÇÃO 5 – COMO PREPARAR A TERRA E ADUBAR
Esse é o segredo e a parte mais difícil do plantio. Verificar quantas horas de sol tem no local diariamente é fácil. Acertar a mão para não deixar a terra muito seca ou muito encharcada também não é muito complicado. Proteger do vento excessivo idem. Mas descobrir os segredos da composição do solo para o bom rendimento das plantas demora a vida inteira.

Não existe uma só receita. Mais ou menos como tempero de feijão, cada um faz de um jeito, mas dá para perceber quando está certo e quando deu errado. E para complicar cada planta é de um jeito: as necessidades nutricionais variam bem.

Eu me sinto um pouco cara-de-pau dando essa lição porque ainda não domino completamente as técnicas de adubação. Mas vou compartilhar algumas dicas básicas que já conseguir captar e seguimos em frente aprendendo juntos.

1 – O primeiro passo para aumentar a fertilidade do solo é incorporar matéria orgânica. Se a terra do seu quintal está dura e sem vida, comece jogando um monte de palha em cima (camada de 30 cm mais ou menos) e deixe lá um tempo. Isso já é meio caminho andado. Se aparecer minhoca, comemore. Se aparecer formiga, agradeça (as formigas são espécies colonizadoras, que ajudam a recuperar solos degradados).

2 – Se você vai plantar em vasos, a receitinha básica é: 40% de terra (qualquer terra), 30 % de areia, 30% de composto orgânico.

3 – Os macronutrientes das plantas são nitrogênio (N), fósforo (P) e potássio (K). N você encontra nos estercos, húmus de minhoca, borra de café (mas como a borra acidifica, melhor compostar antes). O P é abundante na farinha de osso que as lojas de jardinagem vendem. E o K aparece bastante nas cinzas de madeira. Mas não pode vir misturado com sal e gordura de churrasco. Então, se tem uma pizzaria perto da sua casa, peça para doarem para você. Sobre as quantidades, não sei dar uma fórmula, mas é decrescente. Mais N do que P, mais P do que K.

4 – Não use adubação química. Se você vai cultivar de forma orgânica, fique longe dos produtos das lojas de jardinagem que têm letras e número (tipo NPK 10 -10-10). Fique com os insumos que têm nomes de coisas da natureza: esterco, húmus, farinha de osso, casca de ovo, borra de café, cinzas. E, principalmente, faça compostagem em casa! O adubo químico solúvel é o fast-food da planta. Faz crescer e engordar, mas deixa suscetível a doenças.

5 – Observe as plantas que nascem espontaneamente. Elas são indicadoras das condições e necessidades do solo. Dá uma olhada nesse post do querido Gui Reis. http://www.matosdecomer.com.br/2015/08/as-plantas-bioindicadoras-nao-e-tudo.html. Pois eu estou nessa lição. Com os macronutrientes já aprendi a lidar mais ou menos. Para incorporar os micronutrientes aos meus vasos e canteiros estou tendo certa dificuldade e aceito dicas.

MICROLIÇÃO 6 – O QUE PLANTAR?
Isso depende do que você gosta de comer, da época do ano, do espaço disponível, da intensidade da insolação, do acaso (às vezes vc se apaixona por uma planta ou ganha mudas e sementes de amigos). O melhor é usar sementes orgânicas, mas elas são difíceis de encontrar. Por isso, frequentar encontros de trocas é importantíssimo e no Festival haverá essa oportunidade! J Se não tiver sementes orgânicas, fique com as normais, que são vendidas em saquinhos em lojas de jardinagem. Só fuja das transgênicas. Ou seja, grãos milho e soja, se não forem comprovadamente orgânicos, não plante! Na embalagem estão informações sobre período e forma de plantio e espaçamento das mudas.

Uma boa opção é começar a horta pelas ervas: manjericão, salsinha, cebolinha, alecrim, orégano, tomilho. Você conseguirá colher todos os dias e ainda assim as plantas continuarão crescendo. As hortaliças são mais trabalhosas, demoram a dar frutos e em uma salada às vezes você acaba com a safra, o que pode desanimar.

Antes de colocar a mão na massa, a horta dos meus planos tinha sobretudo alface, tomate e cenoura. Três espécies das mais difíceis para cultivar, descobri depois, e que até agora não consigo produzir com regularidade. Eu nem sonhava com almeirão, taioba, bertalha, caruru, ora-pro-nobis, escarola, capuchinha e outras PANCs (Plantas Alimentícias Não Convencionais). Hoje é essa turma, junto com manjericão, couve, capim santo e pimentão, que se tornou abundante no meu quintal.

Às vezes dá a impressão de que certas plantas escolhem a gente e aparecem em profusão, sem serem chamadas. Aproveite a fartura e partilhe os excedentes com amigos e vizinhos. Outras espécies a gente semeia mil vezes, cerca de cuidados e não vão muito bem. Tem a ver com as particularidades climáticas, do solo e outros mistérios que aos poucos vamos desvendando.

MICROLIÇÃO 7 – MUDAS & SEMENTES
Tecnicamente é possível fazer uma horta em casa ou comunitária comprando sempre as mudas e o adubo prontos em lojas de jardinagem. Só que essa não é a experiência completa. Agricultura de verdade é reconexão com o ciclo da vida em todas as suas formas e todas as suas fases, da germinação à decomposição. Também é busca da autonomia, das relações horizontais, de refazer as redes de trocas de sementes e conhecimentos. Na escala doméstica é contrapor-se a um sistema que quer transformar absolutamente tudo em mercadoria e que busca submeter cada pequeno detalhe das vidas de todos nós ao poder do dinheiro.

Germinar as sementes, produzir as mudas e preparar seu próprio composto são partes importantes do processo. Tudo bem comprar adubo pronto de vez em quando ou até as mudinhas que são vendidas no supermercado. Mas vale a pena mergulhar na experiência de aprender a criar vida desde o começo e buscar conexões entre as pessoas e entre as hortas. Você se tornará um guardião da biodiversidade, alguém que vai receber e doar sementes e mudas de espécies que muitas vezes já não existem mais nos supermercados e feiras comuns. Olha só a importância disso!

A sementeira é uma bandeja cheia de casulos, própria para semear (veja a foto). Mas você pode fazer a germinação de copinhos de café, latas ou qualquer outro recipiente pequeno e furado. Misture terra “comum” com composto e passe na peneira para ficar bem fofinho. Aí é só iniciar suas experiências com germinação e trocar ideias com a tribo dos plantadores. O grupo Hortelões Urbanos é ótimo para isso: https://www.facebook.com/groups/horteloes/.

A sementeira é um berçário muito delicado. Precisa ficar abrigado do excesso de sol, de vento e das chuvas fortes. O ideal é construir um estufinha, mas varandas de apartamento e beirais de janelas bem iluminadas também funcionam bem. Não está fácil encontrar sementes orgânicas, então conte com a rede de trocas entre os plantadores. A Daniela Pastanafaz um trabalho lindo na articulação desses grupos. Também dá para comprar pela internet na Bionatur (http://biodinamica.org.br/sementes-bionatur). E aqui em São Paulo tem um lugar incrível para conseguir mudas de centenas de tipos de ervas: a Sabor de Fazenda (http://www.sabordefazenda.com.br/), das queridas Silvia e Sabrina Jeha. Vale o passeio.

MICROLIÇÃO 8 – CUIDADOS DIÁRIOS. E NÃO SE PREOCUPE, VOCÊ VAI ERRAR
Ter uma horta é como ter filho pequeno ou animal de estimação. Você se tornar responsável por cuidados frequentes e imprescindíveis. Se for viajar, terá que arranjar alguém para cuidar diariamente da sua horta. Seja ela no seu quintal ou um projeto comunitário na praça.  Então pense bem nisso antes de embarcar na aventura. Se você é do tipo ultraviajante ou tem uma rotina maluca sem tempo livre, pense em oferecer ajuda a uma horta que já existe. Num verãozão, por exemplo, se você não cuidar sobretudo das mudas pequenininhas por apenas um dia, é provável que aconteça uma mortandade que vai desperdiçar meses do seu trabalho. Então vamos à dicas:

  • Regar demais é tão ruim quanto deixar as plantas secarem. Use o “dedômetro” para aferir a umidade ideal. É assim: você enfia o dedo bem fundo na terra e verifica se está úmida e grudando. Se estiver bem molhado, não precisa regar mais. Se estiver úmido, regue pouco. Se estiver seco, regue bastante.
  • Melhores horários para regar e manejar as plantas: início da manhã ou final da tarde. Prefira os dias nublados e mais frescos para transplantar.
  • A terra deve estar sempre fofíssima como um bolo. Se ficar endurecida, deve estar faltando matéria orgânica, cobertura de palha, água ou tudo isso.
  • Algumas plantas são perenes ou vivem durante várias safras, como é o caso das ervas. Outras têm apenas uma colheita, como o tomate e a alface. Misture esses dois tipos para sempre ter uma horta viva.
  • Enquanto uma safra de folhosas cresce, vá preparando a próxima na sementeira.
  • Quanto mais biodiversidade, melhor. Troque mudas com amigos hortelões, arranje sementes diferentes e vá trazendo novas espécies.
  • Na agroecologia não se fala em ervas daninhas e sim em espécies espontâneas. São os matinhos que crescem sem ser semeados. Não precisa exterminar. Se não estiverem alastrando demais ou atrapalhando o desenvolvimento da planta comestível, deixe lá. Observe o que elas dizem sobre o seu solo. Aqui vai de novo a dica do post do Guilherme que coloquei na microlição 5: http://www.matosdecomer.com.br/2015/08/as-plantas-bioindicadoras-nao-e-tudo.html.
  • O biofertilizante (chorume) do minhocário diluído em água é um excelente adubo para borrifar nas folhas.
  • A cada mês ou quando sentir que a planta está precisando, adube a terra. Mas sem exagero.
  • Contemple todas as etapas da vida: nascimento, crescimento, frutificação, morte e decomposição. Cada uma tem seu encanto.
  • O verão tropical escaldante e sujeito a tempestades é um período complicado para as plantas. Paciência e atenção redobrada nessa época. Se na hora mais quente do dia as plantas murcharem e se contorcerem, respire fundo e aguente. Não é hora de regar. Muitas vezes isso acontece mesmo com a terra bem molhada. Sua planta está tentando se defender da alta temperatura e provavelmente voltará ao normal no fim da tarde. Se a onda de calor dura muitos dias, algumas plantas morrem. O mesmo acontece com as ondas de frio. Vá observando quais são as espécies mais resistentes ao stress climático. Conhecimento fundamental daqui para frente.

Fique tranquilo: você vai errar. Vai errar muito e vai errar muitas vezes. Por falta de experiência, distração, problemas climáticos ou outras razões. Faz parte do processo. Ter uma horta é uma excelente oportunidade de treinar a resiliência, a humildade, a aceitação de que somos falíveis e nem tudo acontece de acordo com a nossa vontade. E se você acertou de primeira, provavelmente não sabe muito bem por quê. Então nas próximas provavelmente vai errar. Só não existe essa história de “não ter mão” para planta. Assim como a culinária, o plantio exige prática e experiência. É fazendo e refazendo mil vezes o ciclo semear, adubar, cuidar, colher e compostar que a gente vai aprendendo “o ponto” de cada etapa.

MICROLIÇÃO 9 – AS ‘PRAGAS’. OU MELHOR, OS SÓCIOS.
Para começar, não existe praga. Nenhum ser vivo desse planeta pode ser considerado uma praga, embora sob certo ponto de vista quem mais mereça o título seja o homo sapiens. Mas desequilíbrios populacionais acontecem. Vamos então chamar o que acontece nas nossas hortas de “proliferações”, que podem ser tanto vegetais quanto animais.

MATOS, MATINHOS E MATÕES – Não se surpreenda se, ao plantar sua muda de alface, outras espécies invadam o canteiro. Tanto a alface quanto as demais hortaliças mais comuns no supermercado são, como diria o permacultor Peter Webb, mimadas. Em geral trata-se de plantas não nativas do Brasil e, portanto, menos adaptadas ao nosso clima e às características do nosso solo. Aprender a comer taioba, caruru, bertalha e outras PANCs (Plantas Alimentícias não Convencionais) faz parte do processo de virar um hortelão.

Aquele visual “pelado” da agricultura convencional não faz bem para o solo, que precisa estar sempre coberto. Então deixe vir os matinhos, aprenda quais podem ser degustados e vai protegendo com carinho as suas plantinhas mais frágeis, o que significa retirar delicadamente quem está querendo sufocar a sua alface, por exemplo. Outra desvantagem do excesso de capina é não deixar alimento para os bichinhos da horta nem esconderijo para os predadores dos bichinhos da horta. Se no canteiro só tiver a sua comida, será o único alimento disponível para os outros seres e aí eles vão atacar mesmo.  Agradeça os matinhos que aparecerem, pois eles inclusive contam como está o solo (de novo, indico o post do Guilherme Reis- http://www.matosdecomer.com.br/2015/08/as-plantas-bioindicadoras-nao-e-tudo.html).

OS BICHOS – Horta saudável é horta cheia de bichinhos. Abelhas polinizam, joaninhas comem pulgões, lagartas serão borboletas, as vespas (carnívoras) ajudam a controlar populações. Formigas em geral são injustiçadas: espécies pioneiras, proliferam em solos degradados e ajudam a incorporar matéria orgânica. Se tem formiga comendo suas plantas, experimente colocar um monte de palha sobre a terra. Elas vão ficar ali felizes nas áreas menos férteis do solo, trabalhando compenetradas para o bem do território. Aranhas, sapos e morcegos mostram a vitalidade do ecossisteminha. Dê boas vindas se aparecerem.

Proliferações de bichinhos acontecem mais nos primeiros tempos da horta, quando há pouca biodiversidade vegetal e animal. Tenha paciência, permitas os matinhos crescerem, plante flores (para atrair bichinhos do bem) e incorpore muita folha seca na cobertura do solo (que deve ter cerca de 7 cm de espessura). Qualquer inseticida é péssimo. Aliás, qualquer produto terminado em “cida” não é para usar, o que inclui fungicida, nematicida etc. Cida — sufixo originário do latim, caedere — significa matar. E a horta agroecológica precisa ser cheia de vida. Ah, o tal neem também está nessa classificação. Eu não uso de jeito nenhum.

DOENÇAS – Às vezes o problema não é nem mato nem bicho. São manchas nas folhas, podridões etc. Pode ser fungo, bactéria, vírus, sei lá. Disso não entendo nada. Se minhas plantas adoecem procuro  entender o que está errado no manejo para tentar acertar na próxima. Se o solo está fértil e equilibrado, a luminosidade, temperatura e quantidade de águas estão adequados, em geral as plantas são saudáveis.

MICROLIÇÃO 10 – COMO AJUDAR NUMA HORTA
Esse é o último post do microcurso. Como deu para ver nos outros 9, cuidar de horta é maravilhoso mas dá um trabalhão. Sempre estamos precisando de ajuda. Felizmente sempre há pessoas bem-intencionadas, mas nem sempre a ajuda é aquilo que precisamos. Então fiz essas duas listinhas simplificadoras baseadas unicamente nas minhas vivências e com tendência de dar polêmica. Peço licença para usar uma linguagem tão direta (assim o texto fica curto) e deixo cada item em aberto para discussão.

O QUE FAZER
– Oferecer insumos: composto, biofertilizante, esterco, mudas, bambus para fazer estacas, sementes, folhas secas, serragem, cinzas, casca de ovos, pó de café, ferramentas, carona para buscar insumos em algum lugar. Mas conte o que pretende doar e veja se aquele item realmente é necessário. Em caso afirmativo, veja se consegue se tornar um fornecedor frequente do item.
– Perguntar: do que vocês estão precisando? E tentar oferecer. Tem serviço para todo tipo de talento. Sempre é preciso fazer placas de identificação e contribuições para o lanche são muito bem-vindas, por exemplo.
– Serviço braçal. Carregar sacos de insumos. Capinar. Podar. Rachar lenha. Manejar a composteira.
– Ajudar a regar. Na época da seca e nos dias de calorão, dependendo do tamanho da horta a rega é uma tarefa bem extensa. Seja em casa ou na praça, pergunte ao cuidador mais experiente quando, quanto e de que modo regar. Cada pessoa tem suas manias, cada planta também. Várias não gostam de água nas folhas, tem as mais sedentas e as que preferem solo mais seco e por aí vai.
– Ser o cuidador da horta no caso de viagem dos que trabalham nela diariamente.
– Perceba que na primeira vez que você vai ajudar seja lá em que tarefa for, você estará solicitando diversas explicações e a atenção do cuidador da horta. Se for algo que você fará apenas uma vez na vida e nunca mais, talvez seja melhor apenas ficar papeando e observando. A menos que o hortelão insista bastante para você participar.
– Colher. Se o cuidador da horta está oferecendo as plantas, aproveite. Nós gostamos muito de repartir o que cultivamos. Mas pergunte como, quanto e quais plantas podem ser colhidas.

O QUE NÃO FAZER
(Antecipadamente peço desculpas se os comentários abaixo soarem antipáticos. Mas são situações frequentes, que tornam mais difícil a vida do hortelão doméstico ou dos voluntários de hortas comunitárias).
– Começar a remodelar canteiros e arrancar “mato” sem antes conversar com quem cuida da horta no dia-a-dia. Existem muitas PANCs (Plantas Alimentícias Não Convencionais) e muitas histórias de canteiros de PANCs que foram dependados porque alguém chegou e resolveu “limpar”.
– Encontrar uma pessoa dando duro na horta e, sem oferecer ajuda, reclamar que os canteiros estão feios, mal cuidados, que tal e tal tarefa deveria ser feita de outra forma. Em geral, sempre faltam braços e sobram palpites nas hortas.
– Encontrar uma pessoa dando duro na horta, não oferecer ajuda e dar explicações sem fim sobre os motivos pelos quais você não participa, contando detalhadamente seus projetos profissionais, problemas pessoais, de saúde e familiares.
– Oferecer seu quintal, outra praça ou seu sítio para o pessoal da horta ir lá plantar, sendo que você não tem intenção de participar. Em geral, o que falta para a expansão da agricultura urbana é mão de obra. Oferecimentos de novos locais para implantação de hortas são bastante frequentes, mas as que já existem têm déficit de voluntários.
– Antes de sugerir embelezamentos, leve em conta que a estética da agroecologia é diferente daquilo que as pessoas costumam identificar como uma horta bonita (canteiros com um único tipo de hortaliça organizado em fileiras e sem nenhum matinho em volta).
– Largar pneus (contaminam o solo), entulho, fórmica (tem muito produto químico e não serve para delimitar canteiros) e outros materiais na horta. Madeira e telhas às vezes são úteis, mas lembre-se que apenas ao largar lá você está dando trabalho extra para os voluntários, que terão que prover um destino ao material. Pergunte antes se o que você tem para doar será útil e participe do trabalho que reutilizará o material.
– Dar uma ideia de alguma melhoria bem trabalhosa que deve ser feita, mas de cuja implantação você não tem interesse em participar.
– Dizer que pretende se tornar voluntário, fazer um milhão de perguntas, solicitar materiais, mais dicas, livros e nunca mais aparecer.
– Adotar um canteiro, ir na horta duas ou três vezes, abandonar o canteiro e não avisar ninguém.
– Dizer para as crianças não se sujarem de terra. É para sujar!
– Roubar mudas, ferramentas e retirar insumos da horta comunitária, sem oferecer nada a ela. Nem material nem trabalho.

Reparou que não comentei o item plantar uma muda? É que o momento do plantio equivale a 0,0001% das atividades na horta. É um instante mágico, mas apenas um instante. O que dá trabalho mesmo é conseguir os insumos, preparar os canteiros e cuidar das plantas por toda a vida delas.

 

150. Comida de verdade até para o Nino

Esse é o Nino. E eu sou a cozinheira dele.

Evito ao máximo os alimentos industrializados, mas até pouco tempo atrás o Nino comia ração. Na verdade, ele passou os 11 primeiros anos de sua vida se alimentando praticamente só de ração. Eu, ativista da comida de verdade, não estava dando conta de cozinhar para a família humana e também para o filho-cachorro. E, bastante culpada, alimentava o Nino com ração “de boa qualidade” (aquela mais cara). Dizia a mim mesma para não ficar tão perfeccionista e sobrecarregada, afinal sou a agricultora, cozinheira, jardineira e lavadeira da minha casa, além de fazer mil outras coisa na vida. Até que fui obrigada a assumir a milésima primeira tarefa cotidiana: cozinhar para o cão.

Isso aconteceu porque, de repente, Nino teve uma diarreia que não ia embora. Na primeira crise, o veterinário medicou com uma injeção “para o fígado” e as coisas se normalizaram. Quando aconteceu de novo, fui para a consulta esperando o mesmo diagnóstico e remédio. Mas o vetê fez cara de desânimo e titubeou quando perguntei a causa. Recomendou um remédio humano para gases, sem muita convicção. Aí farejei o conflito de interesse: “Ele não pode falar mal de ração!”, pensei. Voltei para casa, não dei remédio nenhum e cozinhei um pouco de arroz branco com frango (aquilo que os não-vegetarianos comem quando ficam assim, né?). Em 24hs o problema sumiu. Aí fui estudar o site Cachorro Verde (http://www.cachorroverde.com.br/). A partir desse dia, adeus indústria transgênica da ração.

Isso já faz quase um ano. E o Nino, que vai completar 12 em dezembro, está musculoso e feliz com sua vida de atleta e natureba. Passeia duas vezes por dia, me acompanha correndo em curtos percursos de bicicleta, sobe e desce as escadas centenas de vezes, persegue passarinhos, caça ratos. Depois da mudança, já tentei dar apenas uma refeição de ração: a diarréia volta. Já tentei dar meia refeição de ração misturada com comida de verdade: dá gases. Já tentei colocar umas 7 bolinhas de ração junto com a comida caseira: sem problemas. Então compro um pacotinho de vez em nunca e eventualmente adiciono doses mínimas de ração como uma espécie de momento-junk-food. De resto, sou eu e as panelas.

Das três opções apresentadas pelo Cachorro Verde (dieta natural crua com ossos, sem ossos e dieta cozida), eu e ele nos demos melhor com a terceira. Não vou me atrever a resumir ou dar dicas, pois as orientações são muitas e detalhadas. Se tiver interesse, vai lá: http://www.cachorroverde.com.br/caes/dieta-cozida-para-caes/.

Mesmo usando ingredientes de boa qualidade, o rango caseiro sai bem mais barato do que ração. Olha só:
– Ele come cerca de 250 g por dia e 1 kg de “boa” ração custa cerca de R$ 30. Ou seja, R$ 7,5 por dia.
– Somando os ingredientes (1 kg de arroz integral orgânico quebrado no Instituto Chão está R$ 2, ½ kg de coração de frango sai por menos de R$ 10 e 1 ½ kg de acém moído por R$ 28, os legumes eu colho na horta ou uso as pontinhas e restos dos preparos para as refeições da família humana) são cerca de R$ 40 para duas semanas. Ou seja, menos de R$ 3 por dia.

Mas nem tudo são flores. Tem o trabalho de preparar comida toda semana. Tem a disputa pelo espaço no congelador, já que não possuímos freezer. Tem o trabalho de comprar ingredientes especiais para o Nino. Tem a dificuldade extra, para alguém quase vegetariano como eu, de preparar vísceras, ossos & cia. Principalmente, tem a dor na consciência por comprar pedaços de animais mortos para alimentar meu cão. Incrível o poder alienador da indústria alimentícia: antes de preparar a comida do Nino eu não tinha sentido na pele esse detalhe, embora a divulgação no ano passado das histórias de escravização de pessoas no Oriente para as atividades de pesca da indústria pet tenha me chocado (veja aqui http://www1.folha.uol.com.br/mundo/2015/08/1662374-escravos-do-mar-sustentam-industria-de-pescados-usados-em-racoes-animais.shtml). Na época lembro de checar se a antiga ração tinha peixe entre os ingredientes e, se tivesse, teria trocado de marca na hora.

Enquanto cozinho para o Nino vou pensando nas injustiças. Num mundo em que falta comida para os humanos e a produção de carnes é responsável por tanta devastação, estou eu nutrindo o setor pecuário para alimentar meu querido carnívoro. Isso coloca em dúvida a possibilidade de futuros pets por aqui. Só que, enquanto o senhor Nino está firme e forte, vou criando novas receitas para ele e com ele do lado, mesmo que seja de madrugada, como já rolou…

Separando as raspinhas de legumes da refeição humana para colocar na receita canina daqui a pouco
Especial do dia: rabada com beterraba
A carne, crua, entra na hora de preparar as porções de arroz com legumes que serão congeladas
Oba, hoje tem cenoura, couve e beterraba!
Risoto canino de taioba
Arroz integral orgânico quebrado, taioba, cenoura e coração de frango. Tá servido?

148. Meus produtos de limpeza

Na lista de compras, apenas sabão de coco (em pó e em barra), bicarbonato, álcool e açúcar mascavo. Desinfetante e detergente eu faço em casa. 

Sabe aquelas gôndolas do supermercado onde ficam centenas de produtos de limpeza? Não frequento mais. Quer dizer, entro naquele corredor de vez em quando só para pegar álcool líquido e fujo logo porque o cheiro me faz mal e as embalagens descartáveis prometendo maravilhas dão vontade de chorar.

Reduzir o consumo de plástico é uma das razões pelas quais eu recuso os produtos de limpeza industrializados. Então vou fazendo meus produtos e reutilizando mil vezes as mesmas garrafas pet. A outra é a sopa química de ingredientes que polui nossas águas e cujos efeitos na nossa saúde são pouco conhecidos. Não conseguiria voltar para os limpadores “normais” nem que quisesse. Desacostumei (ou será desintoxiquei?) e tenho dor de cabeça instantânea na presença deles. Até mesmo quando a vizinha lava o quintal fecho as janelas para tentar me proteger do cheiro do sabão em pó.

Então como eu me viro?
LAVAR ROUPAS – Sabão de coco líquido que produzo em casa. Basta derreter uma barra de 100g em 3 litros de água fervente, acrescentar duas colheres de sopa de bicarbonato de sódio e, depois que esfriar, meio copo de álcool.  Lavo em bacia e assim toda a água dá para reutilizar na rega das plantas. Antes da lavagem, deixo de molho em uma bacina com 20 litros de água e 1 litro de enzxima cítrica. Que história é essa de enzima cítrica? Explico abaixo, com fotos. Detalhes sobre meu método ecológico de lavagem de roupas aqui: http://conectarcomunicacao.com.br/blog/141-lavar-roupa-na-bacia-divertido/

LAVAR LOUÇA – Sabão de coco em barra e bucha vegetal. Com enzima do lixo também dá para lavar, já tentei e ainda estou me habituando. Neide Rigo fala sobre isso no blog dela: http://come-se.blogspot.com.br/2015/12/desengordurante-ecologico-feito.html

FAXINA GERAL – Vassoura de palha, aspirador de pó, pano úmido com desinfetante caseiro de citronela (receita abaixo) ou pano úmido com enzima do lixo bem diluída (uma colher por litro). Manchas e sujeira mais grossa: sabão de coco e/ou enzima do lixo sem diluir.

LIMPAR O BANHEIRO – Água da cisterna, enzima cítrica e um pouco de sabão de coco líquido feito em casa. Mais nada.

Onde comprar?
Sabão de coco – Uso a marca Milão e compro na loja online de um colega permacultor. O pedido mínimo é de R$ 300 então vale a pena juntar a família, os vizinhos e fazer compra coletiva. Contato: lojamixeco@gmail.com / http://www.mix.eco.br/.

Bicarbonato – O supermercado vende só saquinhos com 30 gramas (não dá para nada). Compro por quilo em lojas online como essa: http://www.imperiodobanho.com.br/bicarbonato-sodio-1kg-p180  ou em lojas que vendem produtos naturais a granel.

Como fazer?
DESINFETANTE
1. Pegue um montão de folhas de citronela (eu tenho no quintal e é facílimo plantar e cuidar), pique e coloque dentro de um litro de álcool. Quanto mais, melhor. Você pode tirar um pouco do álcool para caber no recipiente.
2. Espere alguns dias para o álcool ficar verde-citronelado.
3. Coloque 2 copos desse álcool numa garrafa PET de 2 litros, acrescente umas 4 colheres de bicarbonato, preencha com ÁGUA (na primeira versão desse post escrevi “álcool” aqui, mas o correto é água). Pronto!
Além da limpeza da casa, serve para lavar as mãos e o corpo em caso de emergência, vide Manual de Sobrevivência para a Crise da Água, páginas 17 e 20. http://aguasp.com.br/app/uploads/2015/04/manual%20de%20sobrevivencia%20para%20a%20crise.pdf

ENZIMA CÍTRICA
Descobri a existência disso por meio do Luiz Felipe Pacheco num curso de permacultura. É um fermentado de 3 partes de cascas de cítricos, 1/2 parte de açúcar mascavo e 10 partes de água. Demora três meses para ficar pronto e tem mil utilidades. O produto final é um líquido amarelo, cheiroso, poderoso e imperecível que serve para limpeza, fertilizante líquido (1 colher por litro) e até para tratar esgoto e desentupir canos. Foi inventado na Malásia pela doutora Rosukon Poompanvong. Tem muita informação sobre isso na internet. Se você entende inglês, pesquise “garbage enzyme”.

Mais informações sobre a enzima cítrica:
https://www.youtube.com/watch?v=Lv0FgPi96Zw
http://www.thediysecrets.com/2009/11/what-is-garbage-enzyme/

Para saber mais sobre permacultura:
http://conectarcomunicacao.com.br/blog/99-um-2012-permacultural-para-voc/

Passo a passo da enzima cítrica
1 – Congele as cascas de limão e laranja. Quando tiver uma boa quantidade, coloque numa garrafa pet lembrando que são 3 partes desse ingrediente.

 

 

 

 

2 – Agora acrecente uma parte de açúcar mascavo.

 

 

 

 

3 – Coloque 10 partes de água e lembre de deixar um espaço vazio na garrafa para conter os gases da fermentação. Escreva a data. Abra e mexa todos os dias por um mês.

 

 

 

 

4- Depois de 3 meses ou mais a aparência é como a dos potes que mostram o líquido amarelo. Coe! Essa crosta preta é da minha primeira tentativa de fazer a enzima, há vários anos, e acabei guardando para “observações científicas” – rs.

 

 

 

 

5- Eu uso uma peneira e essa primeira filtragem vai para o balde.

 

 

 

 

6- As cascas deixo secar bem no sol para depois fazer fogueira em casa (é bem cheiroso) e usar as cinzas como adubo. Mas também jogo direto na composteira de foilhas do quintal. É só cobrir bem para não juntar mosca.

 

 

 

 

7- Aí passo na peneira mais fina e coloco no galão.

 

 

 

 

 

8 – Do galão vai para a garrafa. Espero decantar uns dias e está pronto para usar!

 

 

 

 

 

 

147. 7 sugestões para o ativismo coletivo dar certo

Montagem de canteiro na Horta das Corujas. foto de Pops Lopes

Já faz uns anos que participo de vários coletivos e tenho vivido experiências incríveis de liberdade, fraternidade e igualdade.

Também percebo que não é fácil mudar o jeito de fazer as coisas e a inércia às vezes carrega a gente para a egotrip, a vontade de mandar e outros vícios da sociedade competitiva.

Essa apresentação minimalista eu fiz para apresentar no curso de permacultura da Casa da Cidade e resolvi colocar na roda, pois pode ser útil para outras pessoas.

http://pt.slideshare.net/claudiavisoni/ativismo-coletivo 

Vamuquivamu mudar o mundo!

146. De onde vem a comida?

Cada garfada tem muita história para contar. De onde vem aquele alimento? Quem produziu? Como? Onde? Como foi a comercialização e o preparo? Comer é um ato político, como diz Michael Pollan. E também um ato de amor ou desamor, digo eu. Apostando na primeira opção, fiz de comprar, plantar e cozinhar comida natural, fresca e sem veneno uma prioridade. Sim, gasto bastante tempo, dinheiro e energia nisso. E acredito que não existe maneira mais poderosa e saborosa de mudar o mundo.

O outro lado da moeda infelizmente é o mais comum ainda. A tal praticidade tão valorizada pelo supermercado e pela indústria alimentícia causam altos impactos sociais, ambientais e de saúde. Não por acaso as embalagens e a publicidade fazem de tudo para apagar ou forjar a história dos alimentos que nos empurram. Se os rótulos estampassem as fotos reais de cada etapa de produção, as grandes indústrias do setor e big varejistas iriam à falência. Não faltariam cenas de crueldade animal, destruição de florestas, uso de agrotóxicos, exploração de trabalhadores e manipulação química, entre outros horrores. Por isso evito ao máximo tanto o supermercado quanto os ingredientes convencionais e a comida processada.

Pensei tudo isso quando estava prestes a devorar o prato da foto. Almocinho caseiro feito na hora por mim mesma, num dia mais do que comum. Então resolvi contar a história de cada ingrediente…

A porção verde é composta de caruru e mostarda colhidos minutos antes no quintal de casa. O caruru é uma PANC (Planta Alimentícia Não Convencional), aquilo que as pessoas chamam de mato e geralmente arrancam. Espécie que nasce sozinha sem ninguém plantar, dá até em fresta de calçada. Parente do amaranto, é muito rica em proteína. A mostarda é de uma variedade roxa, cuja semente ganhei do mestre permacultor Peter Webb. Além de plantar em casa, coloquei vários pés na Horta das Corujas, uma horta comunitária na Vila Madalena onde trabalho voluntariamente. Se você passar por lá, siva-se. Mas retire só as folhas que vai usar e deixe a planta na terra continuar produzindo para que outras pessoas também tenham essa oportunidade.

Ao lado, arroz integral com lentinha, pimentão, pimenta, cúrcuma e alho poró.

Vamos por partes:
O arroz integral orgânico Volkman veio do Rio Grande do Sul. É cultivado por uma família dedicadíssima à agricultura biodinâmica. Há anos encomendo dessa marca para o Sítio A Boa Terra (www.aboaterra.com.br), que faz entregas domiciliares semanais de orgânicos em casa. Mas esse arroz foi ainda mais especial, pois minha amiga Thais Mauad organizou uma compra coletiva. Além de sair mais barato, adorei a sensação de fazer parte da turma.

A lentilha veio do supermercado mesmo, assim como o azeite usado no preparo. Nunca achei lentilha orgânica para comprar e estou atrás. Se você souber quem vende, por favor me avise.

Pimentão verde e pimenta vermelha plantados por mim no quintal.  É indescritível a sensação de comer um alimento cuja semente a gente viu germinar. Por falar em sementes, foram produzidas aqui mesmo. Ou seja, já existem várias gerações desses ingredientes na minha horta. E a pimenta nem sei o nome. É uma variedade pequena, redonda e vermelha que a Glycia, minha sogra, trouxe de Minas Gerais. Tão lindos meus pimentões e pimentas… Pena que não fotografei antes de nhac!

Alho poró entregue fresquinho pelo pessoal do Sítio A Boa Terra. Encomendo pela internet toda semana e os vegetais são colhidos na véspera. Viajam para São Paulo durante a noite e de manhã tocam a campainha de casa.

Cúrcuma, uma raiz laranja que dá cor linda na comida, muito aromática e que ainda por cima tem superpoderes medicinais. Comprei no Instituto Chão (https://www.facebook.com/institutochao?fref=ts), um supermercado de orgânicos na Vila Madalena que resolveu partir logo para a utopia e eu amo. Vendem tudo a preço de custo e a loja sobrevive do doações. Sou uma apoiadora e dôo R$ 60 por mês. Posso ir lá fazer compras quantas vezes quiser e vale muito a pena. Pelo preço, pelo clima, pela simpatia dos donos, por estar junto ajudando no sonho de baratear os orgânicos e ao mesmo tempo remunerar bem o pequeno produtor.

Está servido?

 

145. Procura-se conselheiro do meio ambiente

Há dois anos sou conselheira do meio ambiente na subprefeitura de Pinheiros. O mandato está acabando, aprendi muito e vou tentar me reeleger. Precisamos de mais candidatos e as inscrições terminam em 30 de junho.

Na gestão atual, que se iniciou em 2013, fui a terceira mais votada, tendo recebido a enorme quantidade de… 26 votos. Por aí já dá para ter uma ideia de que o CADES é quase secreto na cidade. Além de pouco conhecido e nada divulgado, não é deliberativo (apenas consultivo) e não tem atribuições muito claras. Ou seja, tudo montado para se tornar mais uma instância inútil e irrelevante pendurada na burocracia governamental.

Só que as coisas podem ser diferentes. E nos últimos dois anos têm sido! Desde que me tornei conselheira, juntei forças com as colegas Madalena Buzzo, Joana Canedo e Thais Mauad num Grupo de Trabalho de Arborização e Agricultura Urbana ativíssimo que, entre outras mil coisas, organizou cursos para a comunidade e treinamentos para as equipes de manutenção de áreas verdes da prefeitura. Também por meio do CADES e de permacultores voluntários conseguimos realizar em 2014 um curso de introdução à permacultura urbana que foi sensacional (https://pt.wikiversity.org/wiki/Introdu%C3%A7%C3%A3o_%C3%A0_Permacultura_Urbana).

Então fica o convite para quem quiser entrar nesse barco tentar tornar a cidade mais verde e mais sustentável. Mesmo que eu não consiga me reeleger, estarei pronta para prosseguir nos grupos de trabalho (sim, esses grupos são abertos e não precisa ser conselheiro para participar).

Só tem uma coisa: se você resolver se candidatar achando que alguém vai querer ouvir seus conselhos sobre como a cidade deveria ser, esquece. O chamado é para colocar a mão na massa e esquentar os neurônios tentando encontrar maneiras de quebrar a inércia desse modelo insustentável em que a gente vive. A subprefeitura e seus funcionários têm sido bem parceiros, mas eles estão atolados de demandas e para as nossas atividades acontecerem somos nós que temos que suar a camisa.

Informações básicas

  • Os conselhos de meio ambiente das subprefeituras são compostos por oito cidadãos eleitos por voto direto, com mandato de dois anos, e oito representantes de diversos órgãos da prefeitura.
  • Nem sempre essas cotas são preenchidas, já que nem a sociedade nem a municipalidade dão muita bola para o CADES. Aliás, alguns CADES estão atualmente desativados.
  • Qualquer pessoa pode assistir às reuniões mensais que em Pinheiros acontecem na segunda quarta-feira das 17h às 19h (Endereço: Av. Nações Unidas, 7123 – Alto de Pinheiros, ao lado da estação Pinheiros do Metrô/CPTM. Só que a de julho não vai acontecer). A comunidade pode (e deve) levar pedidos e sugestões ao conselho que sejam relacionados às questões ambientais da cidade.
  • Os conselheiros não recebem remuneração ou privilégio de espécie alguma. A obrigação básica é comparecer às reuniões mensais.

A eleição de Pinheiros – Será em 26 de julho, domingo, na Praça de Atendimento da Subprefeitura Pinheiros ( Av. Nações Unidas, 7123, térreo) das 10h às 16h. Para votar é preciso ter mais de 16 anos e levar o documento de identidade e um comprovante de que mora ou trabalha na região.

Para se candidatar é preciso ter mais de 18 anos e fazer a inscrição até 30 de junho (terça-feira). Documentos necessários: cópia da identidade, comprovante de que mora ou trabalha na região, uma foto e uma carta formalizando o pedido de candidatura.

Para saber mais

144. Em defesa das árvores de São Paulo

Esta carta aberta foi enviada ao Prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, e ao Secretário do Verde e do Meio Ambiente, Wanderley Meira. O texto é resultado do trabalho coletivo do Grupo de Arborização Urbana do Conselho de Meio Ambiente, Desenvolvimento Sustentável e Cultura de Paz da Subprefeitura de Pinheiros, do qual faço parte.

As árvores urbanas oferecem inúmeros benefícios à população, sendo um dos principais atuar como filtro para a poluição do ar. Apenas uma árvore em frente a uma residência pode reduzir em mais de 50% a presença de material particulado nos ambientes internos, protegendo a saúde de seus moradores e até evitando mortes. Além disso, as árvores umidificam o ar, ajudam a combater as ilhas de calor e a evitar enchentes, além de melhorar as condições psicológicas das pessoas. Em Nova York, estimou-se que o decréscimo de material particulado do ar retido pela massa árborea por um ano representaria uma economia da ordem de 60 milhões de dólares em gastos de saúde, principalmente em doenças pulmonares e cardiovasculares – para citar um único exemplo de economia gerada ao município graças à arborização. Isso sem falar nas demais vantagens aos cofres públicos geradas pelos outros serviços que são oferecidos pela arborização urbana.

Só que a maior parte dos paulistanos não sabe disso e vê as árvores apenas como produtoras de “sujeira” (as folhas que caem sobre o solo e os telhados), fontes de danos ao “patrimônio” (devido à quebra de calçadas pelas raízes) e potenciais causadoras de acidentes. Atos de vandalismo são comuns, assim como o enforcamento de árvores, que ocorre quando as raízes são cimentadas, e ferimentos ao caule durante o corte da grama.  Somam-se aos maus tratos infringidos pela população as podas mal executadas, tanto pelas equipes terceirizadas a serviço da prefeitura quanto pela Eletropaulo, e temos um cenário de desastre: muitas árvores com risco de queda e a população querendo se livrar da arborização.

Numa floresta, é muito raro cair uma árvore. Numa cidade onde a manutenção é ruim e os cidadãos não possuem educação ambiental, caem árvores aos montes. Ainda por cima, as pessoas colocam a culpa das quedas nas próprias árvores, pois desconhecem que os fatores já citados e o mau planejamento (plantio de espécies inadequadas ao local) são os grandes responsáveis pelos “acidentes”.

A qualidade do ar é uma questão prioritária de saúde pública em São Paulo e por isso está na hora de virar o jogo em relação às árvores da cidade. Embora o plantio de 900 mil mudas seja a meta número 88 da atual gestão, os números ainda são tímidos (apenas 211 mil mudas plantadas até agora). E os resultados, desoladores: devido à falta de manutenção e fiscalização, a maioria dessas mudas jamais se tornará uma árvore adulta.

Alguns exemplos do que vem ocorrendo na cidade:
– Em algumas regiões os plantios são suspensos durante o período seco (que nos últimos anos se estende por quase todos os meses) porque a prefeitura não consegue sequer disponibilizar água nem mesmo para regar as mudas recém-plantadas.

– Milhares de crimes ambientais (sendo o vandalismo, as podas drásticas, o anelamento e o eforcamento de árvores os mais comuns) não são fiscalizados nem punidos.

– Não existem equipes de manutenção da arborização. O projeto-piloto da prefeitura foi descontinuado. Consequentemente,  as mudas não são acompanhadas, o que na maior parte dos casos resulta em sua morte.

– Não há nenhuma iniciativa de educação ambiental relacionada à arborização urbana em curso. Muitos munícipes recusam o plantio de mudas na calçada em frente ao seu imóvel ou destroem as árvores que forem plantadas pela prefeitura. Sem acompanhamento, fiscalização ou punição.

– As equipes a serviço da prefeitura são hostilizadas pelos munícipes que desconhecem boas práticas de jardinagem, como deixar cobertura morta sobre o solo para evitar o ressecamento e compactação. Julgando serem as folhas secas “sujeira”, não deixam os funcionários completarem o trabalho.

– Não há distribuição, ou sequer divulgação, para as equipes de manutenção de áreas verdes do novo Manual de Arborização Urbana, lançado pela prefeitura em janeiro de 2015. As orientações são desconhecidas pelas empresas que executam os serviços.
– Falta diálogo e cooperação entre a Secretaria do Verde o do Meio Ambiente e as Subprefeituras, com regras nem sempre claras para os munícipes, gerando pouca resolutividade em relação às solicitações de podas e queixas de crimes ambientais contra as árvores.

Tem-se falado na criação de um novo Plano de Arborização para a cidade sem que a atual lei que o prevê (LEI Nº 14.186, DE 4 DE JULHO DE 2006)  sequer seja de conhecimento dos gestores. Corre-se o risco de realizar um longuíssimo processo de criação de regras que serão inúteis, caso o suporte e a capacitação básicos às equipes que estão em campo não ocorra.

Mais do que um plano ambicioso, está faltando real vontade de fazer a arborização urbana da maneira que deve ser feita em São Paulo. A começar pelo óbvio: muda que não recebe água morre em poucos dias.

Atenciosamente,
Claudia Visoni, jornalista, ambientalista e conselheira do meio ambiente na subprefeitura de Pinheiros
Joana Canedo, tradutora e conselheira suplente do meio ambiente na subprefeitura de Pinheiros
Madalena Buzzo, administradora de empresas e conselheira participativa na subprefeitura de Pinheiros
Thais  Mauad, médica e professora da Faculdade de Medicina da USP

143. Manual de Sobrevivência para a Crise da Água

Felizmente São Paulo teve bastante chuva em fevereiro e março. Infelizmente o risco de vivermos um colapso no abastecimento de água não foi embora.

O assunto sumiu dos jornais, mas a situação é muito-muito-muito preocupante. Estamos terminando o período de chuvas sem o nível das represas do Sistema Cantareira, o maior da metrópole, subir acima do volume morto. E os demais reservatórios estão sendo literalmente sugados para dar conta de abastecer 20 milhões de pessoas. Temos menos água estocada do que tínhamos no ano passado e vêm aí longos meses secos. O que vai acontecer ninguém sabe, mas com certeza precisamos nos preparar para situações difíceis.

Nas últimas estive envolvida na edição do Manual de Sobrevivência para a Crise da Água, lançado em 22 de março, Dia Mundial da Água, pela Aliança Pela Água. (E quem sabe escrever quatro vezes a palavra água num mesmo parágrafo atraia mais chuva – rs)

Aqui está o Manual!
– Versão online: http://issuu.com/aguasp/docs/manual_de_sobrevivencia_para_a_cris

– Versão PDF (que acho mais fácil de ler): http://aguasp.com.br/app/uploads/2015/04/manual%20de%20sobrevivencia%20para%20a%20crise.pdf

Os capítulos são os seguintes:
* Por que está faltando água?
* Preparando-se para a emergência
* Práticas de economia máxima
* Estratégias de sobrevivência ao colapso
* Orientações de saúde
* Fontes alternativas de água
* Para saber mais

Além de lidar com a emergência, teremos iniciar desde já a construção de um modelo sustentável de manejo da água. Algo muito diferente do que existe hoje e que vai demandar o trabalho de gerações, mas se começar agora em poucos anos começaremos a ver resultados positivos. Será necessário recuperar a cobertura florestal nas regiões de mananciais e em volta de nascentes, E também implantar infraestrutura verde nas cidades, ou seja, aumentar bastante as áreas não pavimentadas e plantar muitas árvores, entre outras medidas. Além disso, descentralizar a captação de água e o tratamento de efluentes e esgoto. E substituir pastos degradados, eucaliptais e outras monoculturas por agroecologia. Nada disso, porém, é comentado pelos governantes, que apenas listam obras e mais obras muito caras e pouco eficientes.  Nenhuma palavra sobre deixar a natureza se recompor. Se Nova York que é Nova York resolveu seu abastecimento pagando aos sitiantes pela proteção das nascentes, por que nós brasileiros não confiamos na natureza? Será que os atuais detentores do poder conseguirão dar uma guinada rumo à sustentabilidade? Se não, será que dá tempo esperar uma nova geração de líderes?

Vamos torcer para que a crise não se agrave, mas é importante estar preparado para o pior. Boa leitura!