19. Roupas com história

Vale a pena resgatar a velha tradição de passar as roupas infantis de uma criança para a outra em família ou entre amigos.

O título desse post eu peguei emprestado da minha amiga Ciça, o que veio bem a calhar, já que o assunto aqui tem a ver com herdar roupas. Aliás, meu filho Alex já ganhou coisas do Matias e do Tomás, filhos da Ciça. E minha filha Julieta tem o armário recheado de peças que foram da sua adorada prima Paula, hoje adolescente. Sabe a Monica Figueiredo, diretora da revista Pais & Filhos? Pois há um tempo ela fez um brechó hiperlegal em casa e a Julieta até hoje usa uns vestidinhos de verão que foram da Antonia, filha da Monica. (Ô Monica, quando vai ser o próximo?)

Como já deu para perceber, aqui em casa a gente adora receber roupas infantis que foram de outras crianças queridas. E a gente adora também preparar com carinho as peças preferidas e dar para outras crianças, procurando sempre perceber qual o estilo fashion de cada um. Agora mesmo um vestido tamanho 8 espera apenas eu pregar o botão que caiu para entrar na roda da vida novamente.

No meu próprio guarda-roupa tenho uma ou outra peça herdada de amigas. Adoro quando uma delas diz: “Não uso isso nunca e acho que tem a sua cara. Quer de presente?”. Gostaria que isso acontecesse mais vezes.

Doar roupas para pessoas carentes é legal. Também fazemos isso e achamos que, enquanto houver nesse mundo algum ser humano correndo risco de passar frio ou ficar descalço por falta de dinheiro, todo mundo precisa contribuir para a caridade. Mas tudo será muito melhor se algum dia isso não for mais necessário. O que os pobres merecem é receber salários melhores para que possam escolher suas próprias roupas.

As trocas entre pessoas de poder aquisitivo semelhante são mais éticas, mais democráticas e mais gostosas. Saber quem foi o dono anterior daquela camiseta maravilhosa faz com que a gente sempre pense na pessoa ao vestir. Meus filhos aprenderam a gostar das heranças e sentem-se importantes por vestir roupas dos maiores. Parece que vão se preparando por osmose para as etapas futuras. Já eu acredito que essas redes de trocas de objetos colocam nossa família mais conectada à teia da vida.  

Será que vale a pena medir o afeto pelo valor pago pelo presente? Discordo. Prefiro ganhar coisas usadas, com história. Assim como gosto de andar nas ruas pensando nas pessoas que já passaram por elas e não estão mais nesse mundo. Quando vou a um local histórico ou a um lugar selvagem, sempre imagino estar seguindo os rastros de muitos outros que vieram antes de mim e que tiveram a delicadeza de preservar aquele ponto do planeta. É assim que eu gostaria de ser anonimamente lembrada no futuro.

Divaguei demais, não é? Então vamos voltar ao momento de moda vintage…

Em família, já estamos preparando os próximos capítulos de “roupas com história”. No alto do meu guarda-roupa tem uma caixa com várias peças que serão da Julieta quando ela se tornar adolescente. Coisas que eu adorava usar, mas, sabe como é, o tempo vai passando e aquela malha de ursinhos e aquela bolsa de festa cor-de-rosa já não combinam com a fase atual da quarentona aqui. Outro dia, meu cunhado, Eduardo, disse que suas camisas de futebol de times de várias partes do mundo serão do sobrinho Alex assim que ele tiver tamanho de homem. Já a grande coleção que hoje recheia o armário do Alex eu vou guardar com carinho para as crianças da família que ainda vão nascer. Será um privilégio, daqui a algumas décadas, ver novamente uniformes de times exóticos reviverem os momentos futebolísticos que são a parte mais saborosa da infância do meu filho.

One thought on “19. Roupas com história

  1. Oi Claudia,

    adorei o blog, tá ótimo, cheio de coisas interessantes pra ler e pensar, virei freguesa (rs). Também adorei este post sobre Roupas com história, sou super a favor de repassar e receber as roupas usadas das nossas crianças, faço isso desde que o João Pedro nasceu, passo todas as roupas dele para minha cunhada que tem dois meninos e depois que ela usa nos dois ainda me devolve e eu repasso novamente, as que estão em bom estado, para outras crianças. Agora mesmo acabei de repassar peças de bebê para minha cunhada que teve uma menina e roupa de bebê não tem muito isso de sexo né?
    Eu tenho uma amiga, a Cris que me manda sacolas de roupas e brinquedos do Felipe e que o João adora, são roupas ótimas, algumas quase sem uso. Tem também a Renata que mora no México e me manda roupas do Thiago, a Dani que já me deu roupas do Giuliano, enfim, acho o máximo essa troca, são peças realmente com história, que foram usadas por crianças queridas e que visto meu filho com a maior satisfação.

    E você sabe que tem pessoas que não gostam dessa prática e ainda alegam que pessoas que podem comprar não deviam aceitar coisas usadas, acho isso tão fora de moda, a pessoa acha que está se diminuindo aceitando algo usado, é de um orgulho tão sem propósito que quando ouço, deixo pra lá, melhor nem discutir.
    beijos e boa sorte no blog.

  2. Que boa ideia, Cláudia! Tenho várias roupas que estão em bom estado e se entediam, dependuradas, no meu armário. Meu filho também tem dezenas de camisetas em muito bom estado que esperam, dobradas e inúteis, a chegada das traças. É mesmo um desrespeito, reconheço, para com aqueles que poderiam usfruí-las, Mas não sei por onde começar essas trocas. O que fazer?
    beijo e parabéns pelo bem sacado blog.

    1. Realmente, a gente se acostumou a um volume de roupa exagerado e que até dificulta a escolha do que vestir e a construção de um estilo coerente, como dizem as consultoras de moda. E as tais doações para caridade nem sempre são bem utilizadas. Quando entrei em crise em relação ao entupimento do guarda-roupa, decretei uma moratória e parei de comprar coisas novas. Decidi usar minhas roupas até o fim. Está sendo interessante o exercício. Para sair da mesmice, atualizo os acessórios…

  3. Olá Claudia!

    A respeito deste assunto, concordo plenamente. Pena, que no Brasil, ainda, não exista “Garage sale”, prática que em tempos de sustentabilidade e consciência ambiental, seria o máximo, não acha??
    Infelizmente, nem todo mundo “aceita” uma roupa usada, sem sentir-se com o orgulho ferido.
    Parabéns pelo blog, os assuntos são muito variados, mas trazem a preocupação “verde”, o que é muito importante e louvável!
    Vamos fazendo o nosso trabalho de “formiguinha” para alastrar a nossa preocupação “verde”.

    Beijos,

    1. Oi Geny,

      Muito legais seus comentários e sua vivência numa família de origem européia. Também acho o máximo esse lance de “Garage Sale”. Que tal algum dia a gente organizar um evento assim? Bjos,

      Claudia

  4. Outro ótimo texto, Claudia.
    Como já referiram nos comentários acima, há também uma questão cultural no fato de os objectos não mudarem mais vezes de mãos no Brasil. Aqui na Inglaterra há não só as “garage sales”, mas também “car boot sales” e lojas de caridade que, na realidade, funcionam mais como lojas do que como agências de caridade – e ainda bem que assim é. Digo isto porque, na nossa sociedade, os objectos dados ao desbarato, sem método ou sentido de oportunidade, podem dar origem a uma relação caridoso/carente que é chata tanto para quem dá como para quem recebe. Então, instituições como a British Heart Foundation, a Oxfam ou a Cancer Research UK montam lojas nas principais ruas de cada aglomerado urbano e ali vendem objectos usados (previamente doados por pessoas que acreditam na causa defendida pela entidade). É muito legal: ninguém é coitadinho, todo mundo paga o preço estipulado pelo objecto à venda e vai feliz para casa. Feliz porque contribuiu para a causa em que acredita, feliz porque comprou o que queria por uma ninharia e feliz porque vai poder usar uma coisa que, de outra forma, acabaria por ir parar no lixo.
    Eu comprei vários dos livros necessários para a minha tese de doutorado nessas lojas, as chamadas “charities”. As lojas funcionam o ano inteiro no mesmo horário que as outras, de 9h às 17h. Ali são vendidos por ótimos preços todos os objectos que você possa imaginar: brinquedos, roupas, acessórios de moda, discos, talheres etc. Tudo está lavado, organizado, etiquetado e disposto em prateleiras como em qualquer outra loja. Há desvelo – reparo, por exemplo, que as vitrines são atualizadas todas as semanas. Estudantes, turistas, imigrantes, famílias de classe baixa ou média compram lá sem qualquer pudor. Eu gostava de ver iniciativas deste gênero serem banais tanto no Brasil como em Portugal.
    Beijo,
    Andréia

    1. Começam a surgir lojas bacanas aqui que não se envergonham dos itens de segunda mão. Mas, embora ótimas, ainda são raríssimas. Para roupas, Super Cool Market (http://supercoolmarket.carbonmade.com/about). Para presentes, Amoreira (http://www.amoreira.com.br/). Concordo 100% que a gente precisa estimular essa nova maneira de consumo, começando do berço. Sou da OPS Vera Cruz, grupo de pais da escola dos meus filhos. Nesse ano, fizemos um brechó durante a venda de material (http://conectarcomunicacao.com.br/blog/18-um-dia-brech-escolar/). No ano que vem, vamos ampliar a iniciativa.

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