105. Quando a publicidade erra o alvo

Iniciativas mirabolantes para atrair a atenção para anúncios conseguem ser apenas ridículas.

Os publicitários andam inventando estratégias cada vez mais estranhas e intrusivas para vender o peixe de seus clientes. Outro dia, por exemplo, eu estava passeando no Facebook quando um anúncio de iPad começou a chacoalhar na tela. Atordoada, apertei o X para exterminar o inseto virtual. Em vez disso, me vi no site de uma gincana qualquer cujo prêmio era a maquininha. Pensando ter errado a mira, fiz o caminho de volta à rede social. E lá estava a vespa tecnológica zunindo. Apertei de novo o mata-moscas eletrônico, agora com máxima precisão, e – plim! – caí outra vez na gaiola promocional.

Com medo kafkiano de virar prisioneira eterna do marketing digital, fechei o browser e fui tratar da “vida presencial”. Em vez de atiçar meu desejo (inexistente) de possuir um iPad, aquela publicidade deu raiva e me lembrou de notícias recentes sobre os bastidores macabros da fabricação desses gadgets. Assim que voltei ao Facebook (o anúncio sacolejante tinha ido atazanar outra freguesia – ufa!), postei a reportagem “O custo humano embutido num IPad” http://economia.estadao.com.br/noticias/neg%C3%B3cios,o-custo-humano-embutido-num-ipad,100770,0.htm, do NY Times, publicada no Brasil pelo Estadão. Aqui vai um trecho: “Os operários encarregados da montagem dos iPhones, iPads e outros aparelhos com frequência trabalham em condições terríveis. Fazem horas extras excessivas, em alguns casos trabalham sete dias por semana e vivem em dormitórios superlotados. Empregados menores de idade ajudaram a fabricar produtos da Apple, fornecedores da companhia armazenaram inadequadamente lixo tóxico e falsificaram registros”. A indústria de celulares também tem muito do que se envergonhar, como já contei aqui (http://conectarcomunicacao.com.br/blog/93-como-nascem-os-celulares/).

Não foi a primeira nem a última vez que eu tentei fechar um anúncio e acabei no site do anunciante. Ao que parece, são erros intencionais visando aumentar o “click through” da publicidade. Para quem não é do ramo, explico: na internet a eficiência da publicidade costuma ser aferida pelo número de pessoas que clicam nos anúncios. Ao forçar o clique, a turma do marketing infla artificialmente o próprio sucesso, atitude desonesta com o internauta e também com o cliente.

Outro absurdo: em 9/3, a agência paulistana XYZ Live publicou anúncios de página inteira nos jornais para dizer ao mundo que contratou uma vice-presidente comercial e mostrá-la num retrato de 40cm de altura. Puro nonsense, já que a notícia só interessa ao métier e, sobretudo, à turma da fofoca no cafezinho da tal firma. Fiquei imaginando as centenas de toneladas de papel e os litros de tinta tóxica desperdiçados nessa demonstração pública de poder econômico e de imperiosa necessidade de inflar o ego da executiva. Vivendo num mundo de recursos cada vez mais escassos, há infinitas maneiras mais éticas de gastar as dezenas de milhares de reais que foram necessários para comprar todo aquele espaço na imprensa.

Minha hipótese é que essas doideiras são sinal de desespero nos corredores das agências. A exposição maciça à mídia anestesiou o consumidor, que presta cada vez menos atenção em anúncio. Como dizia aquela profética música dos anos 80: “Eu tenho pressa e tanta coisa me interessa, mas nada tanto assim”.

De resto, com honrosas exceções, predomina o feijão com arroz nos reclames. Ou seja, diariamente somos bombardeados por piadinhas sem graça, falsas promessas de felicidade a partir do consumo de produtos ordinários, valores egoístas e preconceituosos.

Até mesmo esse blog, veja só, se tornou vítima da pirataria do marketing. Algum espetinho espetou em alguns posts antigos (que eu raramente inspeciono) links em palavras soltas para anúncios. O engraçado é que os textos são sempre muito críticos ao consumismo. Quando localizo, arranco a erva daninha na hora. Se você encontrar a praga por aí, por favor me avisa que eu vou lá de machado na mão.

PS – Geeente, acho que irritei o hacker! Depois que postei esse texto, 3 palavras apareceram com link publicitário pirata: prêmio, condições e notícia. Por favor não cliquem. Estou indo atrás de quem cuida das questões tecnológicas para eliminar isso. Na ferramenta de edição do blog os links são invisíveis. Espero resolver logo.

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