3. De volta às origens

Cuidar da minha horta em casa me coloca em contato com a natureza e a história da minha família.

Meu pai é filho de colonos, como eram chamados, no início do século passado, os imigrantes que vinham para o Brasil cultivar terras alheias até juntar um dinheirinho e poder comprar o próprio sítio. Trabalhou na roça até os 20 anos, quando se mudou para São Paulo. Meus bisavós maternos eram produtores de café que precisaram incendiar toda a colheita em 1930 porque a bolsa de Nova York tinha quebrado, o mundo entrava em recessão e não havia mais compradores.

Eu nasci e cresci no asfalto, sem nenhum interesse pela vida rural. Mas as preocupações ecológicas me fizeram querer saber de onde vêm os alimentos lá de casa. Há um pouco mais de 10 anos, estava em um grande supermercado fazendo compras quando, pela primeira vez, encontrei vegetais com a palavra “orgânico” no rótulo. Fui correndo para casa e consegui achar, em letras minúsculas, o telefone do produtor. Liguei para lá e atendeu o Joop (pronuncia-se Iôp), um senhor holandês, um dos agricultores orgânicos pioneiros no Brasil, que não entendeu nada da minha empolgação e achou que eu era maluca. Na ocasião, o Sítio A Boa Terra estava começando um sistema de assinatura semanal de cestas orgânicas. Achei o assunto fascinante e escrevi a respeito na revista onde trabalhava. A reportagem teve alguma repercussão e, por isso, alguns meses depois, eu e meu marido (nossos filhos ainda não tinham nascido) recebemos um convite para visitá-los. Ficamos amigos do Joop – que, incrivelmente, tem grande semelhança física com meu pai – e da Tini, mulher dele. Por todos esses anos, mantemos contato e acompanho semanalmente as notícias do Sítio e da agricultura ecológica por meio de um ótimo informativo que chega junto com os produtos (dá para acessar pela internet: www.aboaterra.com.br/artigos). No ano passado, levamos o Alex e a Julieta, nossos gêmeos de sete anos, para conhecer o lugar onde nasce nossa comida. Foi uma experiência maravilhosa.

Joop e Tini, os incríveis agricultores pré-pós-modernos com quem tenho o privilégio de encontrar de vez em quando, me inspiraram a planejar uma horta na casa que acabamos de construir e para onde mudamos há algumas semanas. Ney, nosso jardineiro, plantou várias mudas de espécies comestíveis e meu pai outro dia criou um berçário de alfaces e rúculas que já estão brotando. Agora dedico alguns minutos todo dia para regar a lavoura doméstica. Minha filha adora colher tomates-cereja para a salada e juntas costumamos tomar chá de folhas de hortelã tiradas na hora do canteiro. Já dá para consumir também manjericão, couve, orégano, cebolinha, salsinha e alface. Os pés de mamão e jaboticada ainda são minúsculos, mas um dia se transformarão em árvores. O pé de mexerica foi presente da Lúcia, minha amiga há quase 30 anos. E lembro dela todos os dias quando vou regá-lo.

A vida de micro-fazendeira mal começou e ainda me sinto analfabeta nos assuntos da terra. Mas com certeza já estou mais perto das minhas raízes. Outro dia, no meio de uma reunião de trabalho em que discutíamos ações de marketing e outras realidades virtuais, olhei em volta da mesa e pensei nas origens de todas as pessoas ali reunidas. Há três gerações, éramos todos camponeses.