34. Tá quente ou tá frio?

Tem gente dizendo que o aquecimento global é uma farsa. Tem gente dizendo que a poluição química não é um problema. Nós vamos pagar para ver?

Viajei durante alguns dias e estive no Parque Nacional do Itatiaia. Bem alto, bem frio, bem lindo.  As montanhas ficam acima das nuvens e o Vale do Paraíba parecia coberto de algodão. De volta a São Paulo, calor seco e ardido em pleno julho. Por e-mail, uma amiga confessa seus dilemas em relação ao aquecimento global. Seria uma farsa? Ela viu o documentário dos céticos (http://www.archive.org/details/TheGreatGlobalWarmingSwindle) e ficou encafifada.

Minha amiga pergunta se eu acho que é culpa do homem o planeta estar esquentando. Não tenho nenhuma condição de opinar na polêmica científica internacional em torno do clima. E mesmo os estudiosos parecem perdidos no meio da tempestade de dados que eles mesmos produzem. 

A ciência é baseada em experimentos replicáveis. Idealmente, todas as variáveis precisam ser aferidas e controladas. Isso não acontece em relação ao clima. O sistema é complexo demais, impossível de reproduzir em laboratório. 

A investigação mais ampla a esse respeito foi realizada pelo IPCC (Intergovernmental Panel on Climate Change, criado pela Organização Meteorológica Mundial e o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente – PNUMA). O relatório divulgado em 2007 é tão contundente que gerou reações dos grupos que se autodenominam céticos do clima. Por outro lado, estou acompanhando o escândalo dos cientistas flagrados trocando e-mails em que se incentivavam mutuamente a exagerar nos alertas. Lamentável…

Tendo a concordar com o pessoal do IPCC que a atividade humana está causando a bagunça no clima. Mas certeza não dá para ter. Esse pode ser um fenômeno natural que daqui a pouco passa.  Pode ser que até o final do século a temperatura global suba menos de 2 graus, o que vai ser mais ou menos tranquilo. Mas pode ser que suba 6, o que seria catastrófico. Pode ser isso, pode não ser aquilo e assim vamos.

Em regiões delimitadas (a cidade de São Paulo, por exemplo), a gente sente na pele que a retirada da cobertura vegetal e as descargas dos escapamentos levaram ao aquecimento e ao aumento dos eventos extremos, como secas, ventanias e tempestades. No campo, a devastação da mata faz a água sumir. Tira-se a vegetação, as nascentes desaparecem, a capacidade da terra de fazer reservas em forma de lagoas, rios e mangues também vai embora. Nos lugares rurais pobres da África isso significa que a lavoura e os animais morrem. E as pessoas muitas vezes em seguida, de fome.

Soube numa eco-palestra que os fazendeiros australianos só toparam manter algumas áreas com florestas quando viram fotos de satélite em que as áreas desmatadas eram desérticas e, ao lado, as áreas com florestas eram úmidas.

Pena que, quando se trata de questões ecológicas, o princípio da precaução em geral não é adotado. Tenho estudado um pouco problemas relacionados à poluição química. Assusta. E ninguém dá bola. As indústrias e os governos se apegam nas possibilidades de dúvida sobre as substâncias artificiais fazerem ou não mal para continuar colocando-as nas coisas. Pode ser que câncer, problemas hormonais etc nada tenham a ver com isso. Mas é pouco provável. A polêmica já tem quase 50 anos. O livro que inaugurou o moderno ambientalismo se chama “Primavera Silenciosa” e fala sobre o DDT (escrevi sobre a obra e sua autora no post 14 – A rainha da primavera).

Outro dia eu estava conversando com o Marcelo Furtado, diretor do Greenpeace no Brasil. Ele é engenheiro químico e dizia que existem cerca de 100 mil compostos químicos fabricados pelo homem circulando por aí. Os “testes de segurança” para liberar o consumo dessas coisas são muito superficiais. E ninguém checa a ação conjunta dessas moléculas. De modo que a humanidade toda vive um grande experimento, sem saber no que vai dar. Será que alguma hora acontecerá uma tragédia de grandes proporções? Conseguiremos despoluir quimicamente o ar, a água e a terra? Será que situações pontuais de envenenamento e morte de trabalhadores agrícolas, operários e outras pessoas sensíveis a essas fórmulas não são suficientes para repensar essas políticas? Ninguém quer falar sobre isso.

Com o clima acho que é mais ou menos a mesma coisa. Há uma pressão para acharmos que o mundo superindustrializado, hipermotorizado, sem florestas e encharcado de produtos químicos vai muito bem e que não é preciso mudar nada. Há uma pressão para aceitarmos que as pessoas com mais dinheiro (nós) consumam quase todos os recursos naturais e que os pobres mais pobres vivam sem ter acesso sequer à água potável.

Eu discordo de quem pensa assim.